Mateus 7:13-14: "Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; E porque estreita é a porta, e apertado o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem."
Nos quadrinhos, há um personagem icônico que nos remete ao tema: trata-se do Super-Homem, o homem de aço. Nada de material bélico conhecido na Terra é capaz de feri-lo. No que tange à emoção, ele conhece o amor no seio familiar, que serve como seu pilar moral, indo além da mera compreensão cognitiva de sentimentos como amor, fidelidade, raiva, frustração etc. O homem de aço não é imune aos sentimentos; é educado por um casal humano, infinitamente mais fraco que ele, mas submete-se à instrução deste casal.
Nietzsche nos traz uma reflexão interessante entre o homem animal e o Super-Homem, comparando-o a uma corda esticada sobre um abismo, uma travessia extremamente perigosa onde a corda é o homem, que é tanto uma transição como um declínio. Isso, porém, converge para a ideia do gato de Schrödinger, que propõe basicamente a mesma coisa sob a ótica da percepção, onde se vê tanto o gato vivo quanto morto.
Trocando em miúdos, é semelhante a um equilibrista que decide ir do topo de uma montanha a outra se equilibrando nesta corda esticada. Nesta travessia, são encontrados muitos desafios: vento, chuva, ar rarefeito, frio intenso. O equilibrista não pode olhar para os lados, para cima ou para baixo; é obrigado a manter os olhos fixos em sua chegada, de corpo ereto, firme e extremamente focado, para que jamais desvie o olhar. Caso contrário, ele cai neste abismo, sucumbindo ao homem animal.
Hanán – este é o verbo em sua forma substantiva hén, que significa mostrar favor, ter piedade.
Jesus nasce literalmente da misericórdia, fruto dela para a humanidade, e é naturalmente homem. Ao contrário do Super-Homem, que busca a humanidade, Jesus propõe que se passe por uma porta estreita. Talvez atrás desta porta se tenha essa corda descrita por Nietzsche. Ele me parece um guia para que não se perca o foco. O Super-Homem tem seu alter ego em Clark Kent. Diferente da maioria dos heróis, cujo alter ego é a forma mais poderosa, no Super-Homem, é na fragilidade que ele se esconde na máscara humana.
Essa dicotomia, que na física quântica mostra que a partícula é ao mesmo tempo luz, quando se trata da psique humana, a metáfora é bem profunda, já que o ser humano é um turbilhão de sentimentos: ora está entusiasmado, ora deprimido, ora com medo, ora com raiva, e assim por diante.
Ao tentar atravessar a corda, usando aqui a metáfora da ponte de Sirat, é projetada para que cada passo seja muito dolorido, o que pode causar muito medo e ansiedade, pois para alcançar a meta do Super-Homem é necessário atravessar essa ponte e, certamente, esses sentimentos podem ser a armadilha que o faz cair no abismo.
Esta travessia pode ter vários outros significados. Para Jesus, pode estar representada pela Via Crucis e crucificação, o que dá uma dimensão bem profunda da meta "impossível". Já o Super-Homem, em seu primeiro filme clássico de 1978, quando encontra sua amada Lois morta, incapaz de salvá-la, é tomado por um intenso sentimento, que nem todo seu poder pôde ajudá-lo a superar. Decide então subverter as leis da física, "voltando no tempo" para poder mais uma vez olhar para seu grande amor. Ele não fez isso com todas as pessoas que morreram até aquele momento, nem com a morte de seu pai.
A proposta da porta estreita parece que alivia a pressão da travessia até chegar ao Super-Homem, à busca incessante pela perfeição, uma vez que a porta estreita gera uma sensação claustrofóbica. Podemos imaginar que atrás da porta possa ser encontrado um caminho semelhante a uma caverna com uma fissura com espaço pouco maior que um corpo, que não permite que se olhe para qualquer lado a não ser para frente, ralando entre as paredes laterais, se espremendo até chegar ao outro lado, forçando a lidar com um problema de cada vez, com a visão periférica encurtada. Ainda que seja assolado por medo, ansiedade, raiva, euforia, felicidade, tristeza, incapacidade, esta metáfora facilita sua batalha interna.
Por fim, o Super-Homem proposto por Nietzsche é o símbolo da perfeição, dotado de virtude, e é ela que é a diferença fundamental entre o homem animal e o Super-Homem. Ela é a armadura impenetrável necessária para fazer uma travessia segura e rápida. À medida que se aproxima do final da corda, o que não é virtude vai desaparecendo, mas isto não significa que este homem animal não deva ser amado; ao contrário, deve ser amado com todas as forças, só assim é possível entendê-lo em toda a sua complexidade. Se o universo é formado por cordas vibrantes, significa que estamos sempre nos equilibrando no intuito de manter os sentimentos em seus devidos lugares, para que não afetem nossa percepção real da realidade. Uma vez que percamos o controle deles, o preço seria cair num abismo cheio de escuridão.
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